Maria
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Quando Medito...
Não posso deixar morrer dentro de mim a misericórdia e amor pelos combalidos da vida. É esse amor, é essa misericórdia que me move, que me sustenta no caminho de minha própria vitória, porque eu vejo cada dia mais que não sou diferente deles, sou por vezes pior, porque sei onde buscar as forças, porque sei onde é o caminho da cura e não busco por ele, não permaneço nele.

Então peço a Deus todos os dias que me dê misericórdia e me ensine a amar. E por que peço a Deus? Porque só ele pode me dar. A misericórdia vem do amor de Deus, e não tem preço, é impagável.

Claro que se olhamos o mundo ao nosso redor, podemos ver, a sociedade está doente por carência de misericórdia. Eu já citei outras vezes uma palavra do próprio Deus quando ele disse:

- Misericórdia quero e não sacrifícios.

E nisso eu também pensei. Será que tenho misericórdia dos combalidos ou será que faço somente sacrifícios de minha vida para alcançar o amor e a bondade de Deus? Se faço sacrifícios de minha vida, tudo é em vão. Nunca chegarei a lugar nenhum.

É como disse o apóstolo - obras da carne. Mas se uso de misericórdia ao amparar o meu próximo, então é o amor que me move, o amor que tenho dentro de mim e que vem de Deus. Isso é diferente. Ísso me faz sentir viva, me dá alegria, me dá força para viver e realizar mais do que realizo.

Olho para o que já fiz e me parece tão pouco diante da grandeza da necessidade do mundo à minha volta. Queria poder fazer mais. Queria ter forças, amor, e condições de fazer mais. Mas com misericórdia.

Eu me lembrei agora de ter lido em algum lugar sobre um grande pensador que contestou muito a misericórdia. Acho que foi Nietzsche.

Mas se estudarmos a vida dele, fora dos livros que são divulgados, mas naqueles considerados apócrifos, descobriremos que no final, ele foi objeto da misericórdia ao perder a lucidez e depender da misericórdia de sua irmã durante muitos anos.

E foi ele também que um tempo antes de perder a lucidez escreveu um poema que falava mais ou menos assim - tradução do alemão.

"Oh, velho Deus
Volte para o último dos solitários
Tenha eu um alvo
Tenha eu uma ponte em minha vida
Em eterno lugar nenhum
Oh, volte, Oh, volte velho Deus".

Eu fiquei pensando nesses versos. Que tragédia. Que triste vida. Que solidão ! Ele clamou pela volta do velho e bondoso Deus de quem ouvira falar e refutara. Ele clamou para ter um alvo, uma ponte em sua vida mesmo que essa ponte o levasse a nenhum lugar. A um eterno lugar nenhum. E por fim, a misericórdia que tanto ele contestou foi a que cuidou dele até morrer.

Não estudei muita coisa, mas sei que ele é o pai do humanismo, e eu sou apenas uma mulher que acredita no velho e bondoso Deus. Mas uma coisa eu experimento em minha vida, tanto pelo que vivo, tanto pelo que vejo ao meu redor, nos lugares onde ando, com as pessoas que ajudam, prestam a ajuda pelo direito...

Vejo, e sei, mesmo sem ter estudado, que fé sem direitos humanos, mais cedo ou mais tarde se transforma em bestialidade, brutalidade, embrutece os sentidos e fazemos tudo como máquinas e sei que direitos humanos, humanismo, sem fé, mais cedo ou mais tarde se transforma em bestialidade, em vida embrutecida também.

Hoje ouvi mais uma vez uma propaganda de um novo filme que fala de um exemplo vivo de fé com direitos humanos - a vida e o trabalho da madre Tereza de Calcutá.

Infelizmente na sociedade de hoje os representantes de Deus se esquecem da perspectiva humana e os humanistas se esquecem das perspectivas de Deus.

Para mim, humanismo e temor a Deus, fé, não podem ser dissociados, senão ambos degeneram, entram em queda, como se diz? em decadência - acho que essa palavra diz melhor o que quero dizer. E essa decadência se mostra, se torna clara, no relacionamento com o próximo.

É isso que penso. E você deve estar pensando:

- Meu Deus, ela ficou louca de vez.

O que está falando, e o que eu tenho a ver com isso? Pois é. Não sei. E eu penso assim, você talvez pense diferente. Não importa. Somos diferentes.

Mas isso não me faz ser menor do que você, nem maior. Somos iguais. Inclusive acho que pássaros da mesma pena, mas isso já é o outro assunto que prometi a mim mesma não tocar mais, para não machucar mais ninguém, e não me ferir mais, não cravar mais essa flecha, esse punhal em meu peito.

Vou caminhar aqui, todos os dias em que puder, vou viver cada minuto de minha vida pensando no sol, na lua, no universo de sonhos que carrego dentro de mim, mas não vou mais implorar, pedir por uma coisa que não posso ter.

Vou tentar aceitar os caminhos da vida e vivê-la como ela me foi dada. E minha vida gira ao redor daquilo que eu acredito. E como já disse, eu acredito no velho e bondoso Deus e mais até, eu acredito piamente no natal, na páscoa em tudo isso.

Foi esse acreditar em Deus e na força poderosa que Ele me trouxe que consegui há muito tempo atrás ter coragem de mudar a minha vida. De sair do buraco onde vivia, de deixar de me debruçar sobre meu sofrimento sem fazer nada para sair dele. Foi a fé que me impulsionou por lutar por mim, por minha vida e de minha família. E foi a fé que me fez suportar tudo o que já sofri até hoje.

Sem Deus, eu acho, já teria sucumbido, tirado minha própria vida, me jogado do alto de um prédio, me atirado no fundo de um rio. Na fé eu encontro ideais de vida. Não aqueles inalcançáveis que alguns representantes de Deus gritam por aí, desvirtuando Deus e colocando-o no banco dos réus da sociedade.

A sociedade humanista também tem ideais. Sempre teve. Veja a revolução francesa. Quais eram seus ideais? Liberdade, fraternidade, igualdade. E eles se esqueceram que tudo isso sem Deus, vira tragédia humana. Descontaram a dimensão de Deus.

Eu acho que a revolução francesa revolucionou o mundo sim, mas, eu acho que foi tudo, menos liberdade, tudo menos fraternidade, tudo menos igualdade. Veja a história, leia o que aconteceu. Trouxe benefícios sim, mas a tragédia veio com eles.

Nossa história é uma tragédia, por isso eu não acredito na salvação do mundo como um todo. Isso é utopia. Veja o passado, nossa história, minha, tua - na idade média - as inquisições, as cruzadas, os muçulmanos, os cristãos que em nome de Deus massacraram os muçulmanos. Amargas experiências do passado, reflexos, e me repito, dá fé sem humanismo.

Por que você acha que os muçulmanos gritam contra os cristãos? Eu acho que não é por causa da fé. É por causa da fé sem humanismo. As barbáries que foram cometidas em nome de Deus.

Eu acho que somos responsáveis pelo mundo em que vivemos. Mas temos de ter clareza que mudar o mundo, salvar o mundo é uma utopia.

Mas aí é que vem a responsabilidade, a ética.

Mesmo sabendo que é uma utopia, não significa que estamos isentos de minimizar, diminuir os conflitos, os problemas, o sofrimento. É nossa responsabilidade e para colocá-la em prática, a meu ver, precisamos ter em nosso coração a misericórdia. Sem ela, faremos tudo por fazer e não em agradecimento pelo que já recebemos, não por acreditarmos que o mundo próximo a mim, ao redor de mim eu posso salvar, eu posso ajudar, mesmo que seja uma utopia.

E por que? Porque eu acredito, eu acredito, e sonho ser possível se eu fizer a minha parte. Sei que adentrei com minhas palavras, terras que desconheço. Sei agora que esse é o seu mundo. Sei que não é o meu, e me sinto pequena diante de sua grandeza, mas é nisso que acredito, não sei se me ensinaram isso, porque nunca estudei, mas eu experimento em minha vida essas coisas. Eu vejo no dia-a-dia.

Eu vivo rodeada da miséria, da dor, do sofrimento. Eu vejo as mulheres gritarem a violência sofrida, eu vejo os homens chorarem o seu fracasso, eu vejo tudo isso e sei, só a fé, o acreditar, a vontade de mudar é que os tirará desse buraco, dessa miséria. Se eles não quiserem, não acreditarem, jamais conseguirão.

Você pode dar tudo, pão, casa, muito dinheiro, em pouco tempo eles transformam tudo em miséria de vida. E até pessoas que tem tudo, do melhor mesmo, se não acreditarem, se não sonharem, se não souberem ser possível ter felicidade, e querer, jamais a terão... jamais... e ricos viverão na miséria... de vida...

E por isso eu disse ontem ou hoje que muitas vezes o que fazemos é mais importante do que o que somos para algumas pessoas. Sabe por que?

Porque a maioria das pessoas não sabe que existe para alguma coisa. Que possuem uma incumbência. E qual seria essa incumbência? E como saber se muitas vezes nem sei quem sou eu de verdade?

Já perguntei uma vez: Seria eu produto do acaso? Seria eu uma tabula rasa? Seria eu uma folha limpa, um papel, sobre o qual ninguém ainda escreveu? Seria possível me definir e assim saber minha incumbência?

Eu não sei, não sei, mas sei que sou humana, que acredito num Deus, que acredito no sonho de que tudo pode melhorar. Mas também sei que o homem é, infelizmente, o único que se comporta de forma contrária a sua própria natureza, à sua própria essência.

Veja, nós não precisamos, não somos obrigados a fazer o mal, mas temos um risco em potencial em fazê-lo, já viu isso? Eu vejo.

Eu sei, já falei demais em Deus, mas uma coisa eu ainda queria falar, para você não me confundir com aqueles cristãos, que infelizmente deturpam a imagem de Deus e deles mesmos com suas horrendas atitudes.

Não posso defender o cristianismo como uma grandeza ideológica, não posso defendê-lo ao lado das grandezas como o budismo, o islamismo e etc..., porque o cristianismo se desvirtuou nas mãos humanas, mas eu posso defender um ser cristão responsável, porque acredito que não há, no fim, como você separar o espiritual do material e vice-versa. Isso faria do ser humano um ser dividido. Isso seria perverso demais.

Ele, nós, somos corpo, alma e espírito, tudo junto, tudo embutido, tudo num só, e por isso quando a alma é feliz o corpo sente, quando o espírito tem alimento a alma rejuvenesce e o corpo fica forte.

Quando falei dos cristãos, me referi àqueles que vivem pedindo dinheiro, que exploram a fé do povo. Àqueles que ainda hoje vendem indulgências (óleo santo, curas, perdão dos pecados, prosperidade e etc...). Espero que isso tenha ficado claro.

E quando falei que não defendo o cristianismo como ideologia, é a mais pura verdade, porque para mim cristianismo não é ideologia, é fé, é acreditar que existe um Deus, criador de tudo, que por amor se fez homem em Jesus, morreu e ressuscitou. Eu acredito nisso de coração.
Não tem como explicar. Não há explicação e só vai entender, compreender essa fé aquele que acredita. E foi essa verdade em minha vida que a mudou completamente na juventude.

A partir dali eu comecei a ter coragem para viver, comecei a buscar novos horizontes, vi que não estava sozinha, mesmo quando estava.

Então eu conversava com Deus, dizia o que sentia, o que pensava, o que precisava e ele me dava forças para lutar por tudo isso, para levantar por cima do medo, para levantar por cima do sofrimento.

E ganhei coragem de dizer o que pensava também, e isso você sabe, não me trouxe só alegrias, o sofrimento veio junto, mas eu entendi que para se conquistar a liberdade é preciso sofrer também.

Mas é claro que isso não foi sempre assim. A liberdade não é alguma coisa que se conquista numa vez só. Eu hoje olho e vejo que ainda não a conquistei totalmente e talvez vá morrer sem que o tenha feito.

Sabe por que? Porque ela não é algo palpável, embora se materialize em algumas coisas assim como a prisão. E assim como fui me libertando de algumas coisas fui me prendendo a outras. Muitas das quais me libertei, ou pelo menos tentei me libertar nestes últimos tempos. Não consegui tudo, não vou conseguir mais.

Algumas coisa porque não quero, outras porque não dependem só de mim e outras, e essas são as cadeias mais dolorosas, porque preciso prender outra vez para não mais me machucar, e, nem ferir mais ninguém.

Eu não sei, mas era isso mais ou menos que queria dizer. Sei, falei coisas que nem sei como foram, como eram, ou se eram na verdade, mas é o que sei, o que penso, o que encontrei dentro de mim.

O tempo, esse bendito tempo, há de fazer também sua história em minha vida.
Maria
Enviado por Maria em 17/06/2008
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