Não tenho vergonha de dizer que esse é o meu mundo. Que vivo no meio "desse tipo de gente", como dizem os preconceituosos.

Não tenho vergonha de dizer que o cheiro deles, do aguardente, do vômito, da sujeira, fica em minha pele, em minhas roupas. Não, não tenho vergonha.

Não tenho medo de limpar suas feridas, tocar em seu corpo, dar banho, seja lá o que for.

A vida me ensinou muito cedo que um dia eu mesma vou precisar disso, como já precisei ao estar doente e não conseguir nem me mexer.

Existe alguém que necessitou de me dar comida na boca quando me cuidava num hospital, porque não conseguia mexer o corpo de dor. E existe outra pessoa que me banhou quando não conseguia caminhar e nem sair da cama.

A vida é assim meu caro, podemos passar toda ela sem precisar de nada disso, mas podemos amanhã mesmo necessitar da misericórdia e do amor de alguém.

Ninguém sabe o que será o amanhã. E ainda bem, senão a vida perderia o sentido...

Essa sou eu. Assim, com esta vida comprida caminhando ao redor de mim. Não sei perdê-la, porque ela vai onde estou...