Maria
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Um Minuto de Sirene
 
A noite era um fantástico jogo de luz e sombra no que antes era a superfície lisa das águas... As estrelas se dependuravam sobre esse tapete espelhado como pequenos candeeiros, candelabros de cristais descendo dos céus... A lua, imensa, brilhava sobre o céu de veludo negro. A luz inundava o lugar de uma luminosidade etérea, prateada... Apesar da beleza... a dor não podia ser vista. Escondia-se na escuridão... Afastou o olhar, pois o coração era um mar de emoções... e, na noite escura e quieta, da face pálida escorrem - "para não esquecer" - tristes "sirenes" de silêncio... (Maria).

Homenagem aos atingidos pelo crime da Samarco que não ouviram, porque não houve toque de alerta, o som da sirene alertando para o perigo.
 
Link para o jornal A Sirene, escrito pelos próprios antingidos pelo desastre:
http://www.arqmariana.com.br/jornal-feito-pelos-atingidos-e-distribuido-no-um-minuto-de-sirene/
 
Link do Grupo #umminutodesirene no facebook. Através do grupo é possível acompanhar o que acontece em Mariana, Bento Rodrigues e região, apoiar e divulgar as mobilizações e ações realizadas pelos atigingidos pelo desastre.
https://www.facebook.com/groups/528010130687236/?fref=ts
 
 
Abaixo a Carta do Rio Doce (Watu).

Watu é o nome como o rio é denominado pelos índios Krenak que o consideram, não apenas como um "recurso hídrico", mas como um parente, alguém com quem se comparte a vida e se aprende dela (Luciano. F. F).
 
 
 
O Desastre da Samarco: Balanço de Seis Meses de Impactos e Ações 

Carta do Rio Doce (Watu)
 
Passados seis meses do rompimento da Barragem de Fundão, da Samarco/Vale/BHP Billiton, o desastre se perpetua em uma crise crônica, sentida diariamente para além dos impactos imediatos, visíveis e mensuráveis. Desde o dia 05 de novembro de 2015, pessoas e comunidades ao longo da Bacia do Rio Doce continuam sofrendo, dentre vários fatores, por restrição de acesso à água de qualidade, por impedimento de desempenharem atividades econômicas e sociais, por terem a saúde fragilizada, por verem seus modos de vida territorializados profundamente transformados a ponto de comprometerem a sua reprodução social e pela inadequação de ações institucionais que desconsideram suas necessidades e direitos fundamentais. Tais efeitos, e seus desdobramentos, se manterão presentes na realidade da região ainda por muitos anos, perenizando a tragédia.

A destruição ao longo da Bacia do Rio Doce pela Samarco/Vale/BHP Billiton se mostra como exemplo extremo do que pode ser causado por um modelo de crescimento baseado na extração depredadora de bens naturais. Nos últimos 15 anos, ao menos sete desastres envolvendo barragens de rejeitos de mineração foram reportados apenas no Estado de Minas Gerais. Esse alto índice não apenas mostra que o rompimento de barragens de rejeitos é intrínseco à atividade de mineração como ainda explicita falhas estruturais no sistema de automonitoramento implantado pelas empresas mineradoras e no controle realizado por órgãos de governo. Mais ainda, o rompimento da Barragem do Fundão mostra que os impactos de desastres dessa natureza não se limitam às áreas arbitrariamente definidas como “de impacto direto”, mas repercutem de forma profunda em amplos territórios. Para além da negligência das empresas e do Estado em relação aos empreendimentos minerários, destacam-se ainda imprevidências e inadequações no que tange à gestão da crise, fator que agrava ainda mais o sofrimento social das vítimas, expostas a controvérsias sociotécnicas que aumentam incertezas, disputas institucionais que prolongam esperas, classificações restritivas que intentam definir quem são as atingidas e os atingidos para efeito das reparações.

Observa-se que o poder público não tem sido capaz de aprender com seus erros. Ao invés de investir na capacidade técnica e na independência política dos órgãos de controle ambiental, bem como na participação efetiva das pessoas atingidas ou expostas ao risco; gestores públicos têm optado por renunciar ao seu papel de zelar pelo bem-estar comum, e de exigir que atividades econômicas sejam socioambientalmente adequadas. 

Logo após o rompimento da barragem, o Estado de Minas Gerais publicou a Lei nº 21.972/2016, que define os prazos máximos para a concessão das licenças ambientais, independente da análise dos Estudos de Impacto Ambiental pelos órgãos de monitoramento. No mesmo período, o Senado aprovou o Projeto de Lei nº 654/2015, de autoria do Senador Romero Jucá (PMDB/RR), que seguia as mesmas linhas gerais. Ainda, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou a PEC nº 65/2012, de relatoria do Senador Blairo Maggi (PR/MT), que define que a mera apresentação de um estudo prévio de impacto ambiental já autorizaria a execução de obras, que, nesses termos, não poderão ser suspensas ou canceladas a não ser em face de fatos supervenientes. Tais decisões institucionais não apenas aumentam a chance de novos rompimentos de barragens, tornando as regiões mineradoras ainda menos seguras para as pessoas que lá vivem, como ainda representam flagrante retrocesso na legislação ambiental.

Mais do que isso, o Estado vem transferindo sua responsabilidade de monitoramento para o setor privado, que se mostra incapaz de minimizar a exposição da população a riscos socioambientais. Os problemas dessa transferência se mostraram explicitamente no modelo de automonitoramento do Programa de Gestão de Barragens de Rejeitos e Resíduos, que não foi capaz de impedir o rompimento da barragem do Fundão. Esse modelo de privatização de funções estatais foi mantido no Termo de Transação e de Ajustamento de Conduta firmado entre as empresas responsáveis pelo desastre e os Governos Federal e dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo, homologado no dia 05 de maio de 2016, seis meses após o rompimento da barragem, de forma controversa ao não envolver o Ministério Público nem as comunidades atingidas.

A recuperação ambiental e a reconstrução da vida das comunidades ao longo da Bacia do Rio Doce, bem como a compensação pelos danos decorrentes do rompimento da barragem, exigirão políticas e ações contínuas e, sobretudo, ampla participação das comunidades atingidas. Assim, para além da responsabilização das empresas e dos poderes públicos envolvidos, se faz necessária a reparação imediata dos danos, mediante fiscalização por parte do Estado, com intenso controle social. Ainda, é necessário um aprendizado coletivo com os erros que causaram esse desastre, de forma que ações preventivas sejam tomadas para reduzir a chance de repetição de eventos de mesma natureza no futuro.

Sendo assim, o rompimento da barragem do Fundão impõe uma longa agenda de ações. Tal agenda passa pelo fortalecimento das instituições de Estado, para que possam realizar seu trabalho de forma competente e independente. Ao mesmo tempo, exige que novas formas de participação efetiva sejam construídas para dar voz à população sobre o desenvolvimento das políticas públicas. Mais do que isso, ela traz à tona a necessidade de se debater um processo de transição que retire o Brasil e, particularmente estados mineradores como Minas Gerais, de um modelo de crescimento baseado na mineração depredadora, rumo a uma mineração indispensável e que, ao mesmo tempo, reduza a dependência econômica, social e cultural dos setores baseados na extração de bens naturais.
 
Mariana, 06 de maio de 2016.
Maria
Enviado por Maria em 21/05/2016
Alterado em 21/05/2016
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