Eu sei o que você sabe, eu soube nesta manhã.
Eu imaginei ao certo esta amanhã, por isso despertei,
não era seis horas e fui com você em meu colo
olhar juntos a amplitude do espetáculo matinal.
Nos nutrimos de ânsias e desejos,
enquanto você me ninava em teus braços,
me beijava com tua voz, me acariciava
com tuas mãos de piano que, em braile,
caminhavam pela minha face, passo a passo,
como o teclar desta melodia,
teus dedos desciam pelo meu pescoço,
em meu seio onde se demoravam
a acender todas as luzes e sinaleiras,
para deixar tuas mãos atravessarem
todas as estradas para o outro lado,
o lado do meu coração, ouvindo
e eu sentia e ouvia ele bater
no ritmo de teus dedos no piano,
acelerando, parando, quase sem respirar,
assim, assim, em silêncio, em nossas pausas,
aquelas em que só nossos olhos e o corpo falam...
Eu, agora, eu sei, que perdemos o que,
ainda, nunca tivemos,
que foi sentar ao largo de um banco úmido,
orvalhado, batido pela madrugada,
foi onde perdemos o que nunca tivemos,
mas não deixamos de ser o que sempre éramos amor:
somos música de sonho, flauta mágica
que nascia e ainda nasce
quando o verbo da vida
fala através dos desejos úmidos,
orvalhados de suor empoando
as testas ardentes e famintas de amor.
E foi assim que me perdi,
na única vez que nos encontramos,
você vindo de uma direção,
eu rebatendo de outra
e a paz e mansidão
que havíamos conquistado desmoronou
virou acordos de batalhas de guerra
onde cada um luta com as armas que tem,
espada flamejante ou botelha de luz.
Hoje, descobrimos, estamos perdidos em dois espaços,
separados por uma tênue parede de cristal,
tão juntos, tão perto que não há tempo suficiente
para viver a intensidade do sentir
e não há mais tempo para ir,
nem para voltar, só junto ficar.
Sabemos que duendes mágicos nos fizeram vento,
passageiros de nós e nos cobriram de dobradiças de ouro
e almejos ardentes de beijos, que ainda não chegaram
na choupana de meu amor, onde anseio hoje estar,
para apaziguar nossos desejos e nossa solidão
que quando o vento faz sentir, nos deixa sem voz,
em lágrimas de chorar a saudade que temos de nós mesmos,
um no outro, na imensidão dos sentires,
na plenitude do amor e paixão.