Maria
Prosa e Poesia
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Liames do Tempo
Não se castigue por perder um pouquinho do tempo da vida.
Perder o tempo da gente mesmo é ganhar tempo com a vida.
Então, esse perder é ganhar.
É quando a gente descobre que primazia é primazia,
fogo é fogo e não é água.
Se você sabe que metade dele já se foi
é porque descobriu que a outra metade está contigo,
e se é metade, somando-se a tua, forma um inteiro.

É um olhar diferente, contrário, da matemática da vida.
É como o jardineiro varrendo as folhas secas do chão.
A folha seca o viu e o chamou desejando uma boa tarde.
Ele, bravo, disse que nunca mais iria cumprimentá-la
e ficou reclamando que ela não o ouviu chamá-la, que ela nem o viu.

Quando ela se desculpou ele disse
que não tinha desculpas a dar e mandou ela andar.
Mandou, ela embora. No entanto, ele não percebeu
que estava dizendo justamente o contrário.
Estava dizendo que sentiu a falta dela, que sentiu muito,
ficou triste que ela passou, passou e não o viu, não olhou.

Somos assim. Quando brigamos, quando reclamamos
é porque fomos atingidos no ponto mais importante de nossa vida.
Que muitas vezes tem a ver com a nossa própria identidade,
com nossa essência, com a imensidão do que sentimos por aquela pessoa.

Quando algo se perde no campo há chance de uma semente cair
e o que foi perdido uma árvore germinar.

Se não se acha mais o princípio, nem o fim do tempo
é porque o início e o fim do tempo são um só.
Já se misturaram nos liames do tempo.
É o toque de charme que só a vida pode nos conceder.
E se, por dádiva, nos concede é porque é pra gente mesmo
a felicidade de saber-se dono do próprio tempo,
de não saber onde começa e onde termina
o fio das duas metades do tempo.
Um liame que não arrebenta mais
porque faz parte de um todo, de uma totalidade.

Não se tem mais o tempo, mas tem-se a totalidade dele.
Por isso, podemos sempre estar partindo e nunca estar chegando,
vivemos em movimento e o chegar e partir,
o segundo entre um abraço e outro, entre um olhar e outro,
entre o toque de charme do charque da vida é o tempo que temos.

Que seja de luz. Que seja de festa. De alegria.
Que seja do primeiro ao último evento tempo de alento, de acalanto.
E como se está sempre partindo e chegando, partindo e chegando,
só precisamos aceitar que o que estamos vivendo
é a eternidade do encontro.

Se é a eternidade do encontro entre idas e vindas,
não há mais partidas, posto que já ficaram no passado,
não há mais como alcançá-lo, só dele lembrar.

São lembranças antigas de um tempo de saias de seda e cetim
que, se volta não tem, cabem bem rememoriar
para nos dar alento e entender que o tempo que se perdeu
é tempo ganho, de lembranças amadas,
de momentos que jamais se apagarão de nossos de nossos corações.

É quando entendemos os dois passos da graciosa vida que vai além da primeira porta,
que se move nos levando com ela para um tempo sem indolentes homens tortos
que varrem as folhas secas caídas ao chão como se nem valor tivessem,
vamos com ela ou, ela nos leva, para um tempo sem mortos.
Um tempo de vida. É o tempo de se viver. E é o tempo de agora.
Maria
Enviado por Maria em 31/10/2022
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