Fosse Mar
Fosse mar seria magoador,
mas é rio...determinado, corrente...
zeloso, generoso até com as pedras
no percurso até o mar.
Generosidade dolorida,
quase uma automutilação.
As pedras doem.
Cortam suas águas
profunda e solenemente.
Não há perdão,
nem desvios
pra não se machucar.
O jeito é ir, ir, ir, sem olhar
as pedras do caminho.
Sentindo-as rasgando o ventre
e o próprio coração.
Mas seguir em frente.
Suas águas não o deixam só...
é ele inteiro, cada gota.
Infiltra-se à terra
para deixar seu sangue
no barro que lhe faz caminho.
Seus rastros formam paisagens
que ele nunca mais vê.
Seus olhos jamais contemplam.
Como nossa retina
que fotografa tudo pra memória...
Espelha os frutos que ajudou a nascer,
por isso segue em frente
como que satisfeito.
Ao chegar ao mar
suas águas doces
viram salobras.
Ele se doa,
a maior parte do mar, é rio...
não sal...
E cura...
Abre mão
de sua própria identidade.
Invisibilizado evapora.
Então cai como chuva...
Com Rose Rocha (em memória)
Maria
Enviado por Maria em 08/03/2023