Há dias e há dias.
Há dias em que cansa folhear antigos pergaminhos,
painéis do livro de vida de uma face de pálidos olhos azuis.
A emoção da espera de um som explícito na capa da brochura da vida,
a procura diária pela voz amada nos diversos capítulos
- que não há porque separar se fazem parte do mesmo fio do tear da malha da vida -.
Talvez - e aí há que considerar o que já se imagina ser, mas não se quer acreditar -
que são diversos fios sendo tecidos em mantas e vidas diferentes.
Há dias e há dias.
E há dias em que cansa procurar, com a ponta da unha sem cor,
um fio que se assemelhe à própria vestimenta - cores, textura, cheiros e matizes.
Em momentos assim, o sentimento é abandonar a procura
como já foram abandonadas as buscas
por mais um sopro do silêncio profundo no mensageiro do tempo.
Há dias e há dias.
E há dias em que não se reconhece o sol nas vozes das outras estrelas.
Ou, se se pensa ser o tremular de seus raios a tocar a pele
pelo soprar das cítaras de uma orquestra no palco da vida,
não se entende porque um piano toca no lugar de um violoncelo,
uma flauta ressoa magnífica quando o vento leva o som
como se fosse o de uma cítara ancestral
ou o bater dos sinos da igrejinha perdida entre o céu e a terra.
Há dias e há dias.
E há dias, de silêncio, que calam tão profundamente na alma
que esta se vê no espelho e compreende que não existem palavras
que possam como o silêncio se expressar - abraça-se, acolhe-se
e com o olhar - distante, mas presente à janela do tempo,
ressoa o som, a melodia, o sopro que se expande
por sobre os abismos milenares,
por sobre a montanha ainda abraçada pela névoa,
cujo cume já pode ser visto, no entanto, ainda,
com os dedos, não se pode a terra -
com suas areias e pedras, flores, florestas e águas,
torres de musgos e líquens - abraçar e beijar...
É que... há dias e dias...
E há dias em que a Lua se vê no espelho do Sol
e compreende que se os seus raios amados
conseguem se estender em silêncio e lhe abraçar na voz de outras estrelas
também a sua pálida e tênue luz tem esse poder -
de navegar, silenciosamente, o céu e calar
como cala o cinzel sobre a pedra -
tatuando em sua textura, dos dedos, o sentimento, a emoção -
na poesia e na alma da maior estrela do universo
o murmúrio de seu silêncio iluminado e profundo.