Maria
Prosa e Poesia
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Textos

Farelos de Pó

 

Não sei mais falar do pó e do vento.

O pó e o ventou sou eu. E não me conheço mais.

Me deixo levar, em farelos de pó,

pelo soprar das ondas e tormentas.

Talvez já morri e pra sempre e ainda não sei.

 

Arrasto minha carcaça pelos corredores da vida,

sozinha e perdida até de mim.

Se me escondo num canto

com um pergaminho de papiro e um pote de nanquim

me acham, mas fingem que não.

 

É onde, no escuro, faço a festa da solidão.

Me enfeito de barro e me dizem -

homens que se dizem areias do tempo -

que o barro eu sou...

 

A morte que morre bem não é notícia,

talvez um informe rápido

e distante de quem vive.

 

E o tempo se esvai com a boa linhaça da juventude.

Não abre mais portas

e as que abre bate com força para fechar.

 

Não sou aprendiz da fome, já nasci faminta e sedenta.

Mas não preciso aprender a beijar a terra.

Meu beijo é de luz e tem destino -

olha para o sol que vais ver

a tatuagem de meus lábios em seus raios amados.

 

Pra que perguntar o nome se já se sabe que são cinco mais três?

Somam oito que é o tempo que a dona do sol comanda seu destino -

"minha vida é com ela" diz o astro de calor e luz.

E são oito canetas sobre a mesa.

Repousam serenas e mudam sua ordem

de acordo com as vozes e fatos.

Há um controle ritmado para que nenhuma se perca.

 

E as outras dez que contam o tempo

entre o nascer de um flor num jardim - onde estão?

Sem valor, foram apagadas como se nunca existiram.

São passado, queimado e apagado pra nunca mais chorar.

É que o barro que sou,

são só meras e esquecidas lembranças na soleira da porta

e pertencem a um tempo que já passou.

Rascunhos de memória que só eu sei.

 

Ninguém mais sabe, ninguém mais quer saber.

Restei lembranças de pés de barro.

O resto que fui a carrocinha levou.

Não volta mais, pois o tempo volta não tem.

 

Agora caminho assim: presa, enlaçada

num mundo em guerra há milhões e milhões de anos.

E nesta guerrilha, ninguém mais entra, ninguém mais sai

e se sai é pra lutar até a morte, com glórias e fogos de artifício alcançar.

 

Eu? Sou guerreira com beijos de luz.

Levo a pólvora, você leva a arma.

Eu levo o trapo, você faz a bucha.

Você fica com a rosa.

Eu? Eu fico com o jardim.

Simples assim.

Maria
Enviado por Maria em 20/05/2023
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