Não sei mais falar do pó e do vento.
O pó e o ventou sou eu. E não me conheço mais.
Me deixo levar, em farelos de pó,
pelo soprar das ondas e tormentas.
Talvez já morri e pra sempre e ainda não sei.
Arrasto minha carcaça pelos corredores da vida,
sozinha e perdida até de mim.
Se me escondo num canto
com um pergaminho de papiro e um pote de nanquim
me acham, mas fingem que não.
É onde, no escuro, faço a festa da solidão.
Me enfeito de barro e me dizem -
homens que se dizem areias do tempo -
que o barro eu sou...
A morte que morre bem não é notícia,
talvez um informe rápido
e distante de quem vive.
E o tempo se esvai com a boa linhaça da juventude.
Não abre mais portas
e as que abre bate com força para fechar.
Não sou aprendiz da fome, já nasci faminta e sedenta.
Mas não preciso aprender a beijar a terra.
Meu beijo é de luz e tem destino -
olha para o sol que vais ver
a tatuagem de meus lábios em seus raios amados.
Pra que perguntar o nome se já se sabe que são cinco mais três?
Somam oito que é o tempo que a dona do sol comanda seu destino -
"minha vida é com ela" diz o astro de calor e luz.
E são oito canetas sobre a mesa.
Repousam serenas e mudam sua ordem
de acordo com as vozes e fatos.
Há um controle ritmado para que nenhuma se perca.
E as outras dez que contam o tempo
entre o nascer de um flor num jardim - onde estão?
Sem valor, foram apagadas como se nunca existiram.
São passado, queimado e apagado pra nunca mais chorar.
É que o barro que sou,
são só meras e esquecidas lembranças na soleira da porta
e pertencem a um tempo que já passou.
Rascunhos de memória que só eu sei.
Ninguém mais sabe, ninguém mais quer saber.
Restei lembranças de pés de barro.
O resto que fui a carrocinha levou.
Não volta mais, pois o tempo volta não tem.
Agora caminho assim: presa, enlaçada
num mundo em guerra há milhões e milhões de anos.
E nesta guerrilha, ninguém mais entra, ninguém mais sai
e se sai é pra lutar até a morte, com glórias e fogos de artifício alcançar.
Eu? Sou guerreira com beijos de luz.
Levo a pólvora, você leva a arma.
Eu levo o trapo, você faz a bucha.
Você fica com a rosa.
Eu? Eu fico com o jardim.
Simples assim.