Quantas vezes as portas bateram em minha face,
tantas e tantas que só vi as costas viradas
sobre o tampo da mesa
ou se esvaindo pelo batente escorrido de lágrimas...
Tentaram me ensinar o jogo e suas regras,
mas me descobri sem mãos para brincar de viver.
Propus morrer e disso eu soube bem fazer.
Também acho que se me esclarecessem
o que de imenso eu faço parte,
se me dissessem o por quê de cada coisa
eu, talvez, pudesse compreender - ou não!.
Quantas vezes me povoaram do amargo
e me revelaram meu não-ser
no mundo que ousei "invadir"
e, tal qual nau sem rumo, percorrer.
Sou simples assim.
Mal-querida e sem belezas
para sobre a mesa
de pesamentos colocar.
É injusta a guerra, é injusto o comparativo
entre uma ramagem de tortos ramos,
flores e folhas secas caídas ao chão
e a flor da neve que faz seu leque de amor.
É neste mistério de quem seja
que me beira a pergunta: e você?
Onde está que calou
a voz inusitada e extraordinária da vida?
Onde anda o semblante encarquilhado de sonhos
que desciam as corredeiras de um rio
pelos penhascos da montanha querida?
Era um deságue sincero e ardente de luz
que esbanjava nas linhas em branco
que se seguiam ao canto de amor.
E me falavas da dimensão transcendental
do sentimento cujas descobertas também doem.
E desenhavas diagramas da dimensão enigmática do ser
deitadas sobre a mesa em meio ao caos
e o gole de chá na xícara amada.
Tudo muito simbólico para nada significar.
Tudo muito estratégico para não confundir
e os olhos que tudo olham a percepção não errar.
Como não ligar o enigma à razão? Como ?
Nem é possível esquecer...
Só olhar e rezar para que o tempo nos poupe
de não viver, de não ser...
e nos permita um minuto que seja da eternidade de vida
que beira o pulsar no peito...
o arder a vida nas iniciais escritas,
num pacto sagrado,
pacto do sangue das lágrimas, na palma da mão...
"Essa dimensão enigmática não devemos jamais esquecer (alguns a esquecem rapidamente);
não devemos jamais nos fascinar com ela (outros ficam aturdidos com ela);
devemos detectá-la e reconhecê-la em todas as coisas.
Sem esquecê-la para as coisas. Sem esquecer as coisas.
Ligar o enigma à razão, mas não conforme uma reciprocidade mecânica:
há um enigma da razão, mas não há razão no enigma"
(Edgar Morin).