O Viver Entre Cataclismas
E assim seguimos.
Um dia uma voz de uma nota só.
Noutro a lembrança dolorida
das saudades e silêncios que ficaram.
Como viver tranquilamente
entre os cataclismos do nascimento e da morte?
E quando as perdas são propositais
e nos ferem tão profundamente
que jamais serão as feridas curadas?
Como lidar com as perguntas
sobre o profundo que desconhecemos?
Sobre o que não sabemos,
o porquê das coisas serem assim ? Como lidar ?
Não existe um viver tranquilo
quando as perguntas são existenciais...
quando o espírito busca e rebusca
os meandros de dentro, os oceanos mais profundos
e mais intensos de nosso navegar pelo universo de luzes.
Cada dia cavamos mais um pouco a alma de poço.
Cada dia vamos mais fundo em nós...
Não há tranquilidade, não há paz
que nos permita esquecer o cinzel das mãos
e pausar densas buscas e procuras...
E mesmo quando nos encontramos conosco mesmo,
é na alma do outro que passamos a cavoucar -
e tão incansavelmente -
no intento de se descobrir mais sobre si...
posto que almas-gêmeas se completam em amor,
mas precisam ainda, se redescobrir em sua outra metade.
Tem razão o pensador quando diz que
nossas "vidas são minadas de dentro"
e "às vezes em tais profundidade"
que nós mesmos nunca nos daremos conta...
E a água escorre pelos lábios e íris dos olhos
formando corredeiras inatingíveis pelas ondas do tempo.
Crescem e aumentam sua potência
à medida em que são partilhadas (com+partilhadas)...
E... quando nos encontramos neste mergulhar em nós...
nada, absolutamente nada é satisfatório.
A insatisfação do espírito nos leva a cavar mais fundo na alma
em busca de novas descobertas
sobre si, sobre o outro em nós... sobre Nós!
"Todas essas vidas são minadas de dentro. Às vezes em tais profundidades que o sujeito não se dá conta absolutamente. Penso aqui em A... Ele se convenceu de seu próprio bem-estar. E, no entanto ele sabe o que tinha desejado e o que não realizou, ele sabe da morte, ele sabe... [...]. Mas ele imagina ser feliz. E com tanta força que, às vezes, se pode vê-lo radiante com todo seu corpo, sorridente com toda sua alma... Na realidade, a comédia que ele representa sinceramente não convencou a todos os A. que ele comporta em si. Sua paz camufla aflições tão indefesas que, por isso mesmo, necessitam dessa comédia" (Edgar Morin).