Ele

Ele ama poesia - só não sabe ainda. Ele é poeta - dos antigos, puros, completos. Só não sabe ainda. Ele fala poemas - solta frases poéticas, sem métricas - Só não sabe ainda. Ele esconde o poeta debaixo da pele do cientista, do homem que causa espanto para que não olhem pra dentro dele, não consigam espiar sua alma. Ele esconde as fragilidades, as humanidades, as dores, lágrimas e risos, os gritos de felicidade, o amor e a paixão pela vida para que todos o vejam como forte, como aquele que tudo supera, que tudo vence... como aquele que não está nem aí ... que não se importa com nada, nem consigo mesmo, nem com os outros.... como aquele que absurda para que todos o olhem sem se aproximar demais, sem querer estar perto demais... ele brinca e usa a ironia, porque é extremamente tímido, tem medo de falar... por isso não olha nos olhos, não fala com quem ama navegar profundidades... porque tem medo de se expor, de que vejam sua essência, de que descubram que ele ama música, poesia, os poetas, as flores, a natureza, o vento, o tempo, o silêncio profundo, ama a melancolia de um dia sem fazer nada, a brisa que leva a barba e o cabelo como fosse os dedos ao piano... o sol que abraça quente e querido, as nuvens que enlaçam e protegem... Ele não sabe, mas eu conheço o que há por debaixo de toda aquela casca... Sei quem ele é de verdade. Mas não posso nem pra ele mesmo, nem pra mim mesma dizer... É tudo em sua complexidade, é tudo em sua simplicidade. A totalidade de um ser controverso e ao mesmo tempo tão perto, tão conhecido... sei porque me reconheço nele... porque somos iguais... poetas e felizes por ver poesia no som de uma folha que cai, na luz de um beijo do sol, no abraço da névoa de uma manhã depois de uma noite de chuva...