Se falo e me respondo,
se me ouço e me deixo sussurrar
é porque, talvez, talvez,
não tenha com quem dialogar.
O espelho está mudo,
apenas balbucia algumas palavras
e as vozes ecoam em meus pra dentro
em gritos e barulhos ensurdecedores
de meu próprio choro, de minha dor
no limiar da noite que passou...
Fecho os olhos pra pensar.
Hoje podia ser diferente.
Hoje podia ter olhares entre paredes,
sorrisos no entrecruzar de portas,
perfumes deixando rastros no caminho
para o respirar do coração.
De que me adianta
carregar profundidades tangíveis,
desenhar um retrato íntimo de meu caminhar
entre o desejo e a efemeridade -
essa imagem que traduz
a sensação de pertencer ao tempo,
mas sem liberdade para escapar
das amarras que ele impõe... ...
Se evoco a escassez
tanto quanto a esperança,
se me afundo em paradoxos
entre o que tenho e o que busco -
essa melancolia que é quase universal,
que me conecta
ao desconhecido que ensejo,
ao sonho que parece estar
além do meu alcance.
É no vento que abraça
e carrega o tempo
que encontro a beleza
de minha própria fragilidade:
a consciência de que cada dia vivido
é um passo tanto em direção ao sonho
quanto ao seu fim...