O tempo, taciturno, medita:
se falo -
ou me calo... sei lá...
Não há mais surpresas.
Todas já foram ditas, declaradas, explanadas -
assim, assim:
olhos nos olhos,
coração em chamas de lágrimas:
“minha vida não é com você”,
“não haverá NADA!”.
Então, na verdade, na verdade...
NADA há.
Por isso, faço inventário do que tenho:
um tempo ao lado - anos-luz de sonhos, talvez...
uma janela do tempo profundo
e um espelho.
Falo com ele.
Assim, assim... (in)lucidamente...
No passado, mulheres como eu
eram queimadas em fogueiras.
Tidas como insanas, bruxas,
almiscaravam a alma
ao sonho das vozes de dentro
e não tinham medo
de (des)dizer suas impressões.
Inspiravam-se no tempo,
no invisível, no (in)palpável.
Diziam! Tudo!
Tudo e Nada -
ao mesmo tempo!
O Tudo do NADA!
E não lhes era permitido viver
os sonhos, o acreditar, a esperança...
nem o que sentiam, queriam, desejavam -
ardentemente - (sobre)viver.
Hoje?
Não é diferente.
Mantém-se o corpo
(sim, não é queimado),
mas... queima-se a alma,
assassina-se o espírito.
Não nos é permitido o sonho viver,
o acreditar experienciar,
a esperança esperar...
O tempo, taciturno, medita:
se falo
ou me calo.
Ainda falo!
Porque carrego
um pássaro de sonho
dentro do peito -
que pulsa, que bate,
que já tentou tantas vezes,
mas ainda
(Deus cuide que isso mude)
não morreu.
A vida? Assim?
Foi-se. Partiu.
O sonho?
Foi pelos olhos do espelho,
deletado!
Numa palavra só.
Num toque só:
Na esperança que engana,
no acostumar com a tristeza,
na falsidade do todo,
na tristeza e dor não abandonáveis,
no medo que bate à meia-noite.
No olhar longínquo
(do lado de cá do espelho)
que é ignorado,
inexistido,
mantido - em seu corpo - longe,
bem, bem distante...
É assim que se morre um sonho.
É assim que se morre uma alma.
É assim que se morre uma mulher.
Porque...
Uma mulher sem sonhos
é dona de NADA!
Uma mulher sem sonhos
é uma alma Morta!
Assim, assim: Sou Eu!
Uma Morta que viva está!